Rebel: Imagens, palavras...a essência... a natureza

Rebel

LOOKING IN WINDOW


R.E.B.E.L - Most View- - Week- Top Ten

sexta-feira, 1 de dezembro de 2023

Livro Vermelho

Lançado (2009), faz pouco tempo Livro Vermelho, uma das, senão a mais importante obra póstuma de Carl G. Jung.
Entre consultas com pacientes, após o jantar com sua mulher e filhos, sempre que havia uma ou duas horas vagas, Jung sentava-se em um escritório cheio de livros no segundo andar de sua casa, e induzia “alucinações” sob a forma de Imaginação Ativa.
Como Jung escreveu posteriormente em Memórias, sonhos e reflexões:
“Para captar as fantasias que se desenrolam em mim por dentro, eu sabia que devia mergulhar fundo nas mesmas.”
Ele então se encontrava em um lugar intermediário, tão abundante de criatividade quanto de ruina potencial, acreditando ser esse o mesmo lugar visitado tanto por loucos quanto por extraordinários artistas.
Jung registrou cada momento.
Inicialmente tomando notas em uma série de pequenas cadernetas negras, e então começou a analisar suas fantasias, escrevendo em tom profético, em um enorme e majestoso livro de couro vermelho.
O livro detalha com uma fineza de detalhes uma viagem psicodélica através de sua própria mente, uma progressão vagamente Homérica de encontros com pessoas estranhas ocorrendo em um deslocado cenário onírico.
Escrevendo em alemão, ele preencheu 205 enormes páginas com elaboradíssima caligrafia medieval, e com pinturas ricamente coloridas e incrivelmente detalhadas.
Quem fez a publicação acontecer:
O analista Junguiano americano Stephen Martin e um historiador londrino Sonu Shamdasani, são que levam além de escavar, tornar público os velhos escritos de Jung, como por exemplo palestras que ele ministrou no Clube Psicológico de Zurique, ou cartas não publicadas. Tanto Martin quanto Shamdasani, que iniciaram a fundação em 2003, têm trabalhado para desenvolver uma relação com a família Jung, os donos e notórios guardiães dos trabalhos de Jung. Martin diz o que praticamente todos que já trabalharam com a família Jung dizem: “É delicado, as vezes,” e adicionando como explicação, “Eles são muito suíços.”
O que ele provavelmente quis dizer com isso é que os membros da família Jung que ativamente trabalham com os escritos de Jung, tendem a agir muito cautelosamente e com ênfase na privacidade e decoro, e são por vezes surpreendidos pela forma relativamente casual e totalmente informal que Junguianos americanos se metem nos assuntos da família.Aparecem americanos batendo na porta da família em Küsnacht sem aviso prévio, americanos pulando a cerca em Bollingen, na torre de pedra que Jung construiu como a residência de verão da família, ao sul do lago Zurique. Os americanos importunam Ulrich Hoerni, um dos netos de Jung que cuidam dos arquivos da família, quase semanalmente, com pedidos para várias permissões.O relacionamento entre os Jung e as pessoas que são inspiradas por Jung é, quase que por necessidade, uma simbiose complexa.
O Livro Vermelho – que de um lado descreve a auto análise de Jung e se tornou a gênese do método Junguiano, por outro lado é incomum demais para possivelmente constranger a família – contém uma certa carga elétrica. Martin reconhece o dilema dos descendentes: “Eles o possuem, mas não o viveram,”
ele diz descrevendo o legado de Jung,
“e é preocupante para eles, pois todos nós sentimos como se também fossemos donos.”
Até o próprio Jung reconhecia a tensão, pois há o rumor de ter uma vez dito “Graças a Deus eu sou Jung, e não Junguiano.”
O Livro:
Tendo vivido quase sozinho com o livro por quase uma década, Shamdasani, que é um amante de vinhos e de jazz, ultimamente tem ostentado no rosto o aspecto de quem recentemente encontrou o caminho em um enorme labirinto.
Em sua ultima entrevista, tinha acabado de adicionar sua nota de rodapé número 1,051 no Livro Vermelho.Essas notas mapeiam ambas as jornadas de Jung e de Shamdasani.
Elas incluem referências a Fausto, Keats, Ovid, os deuses nórdicos Odin e Tor, as deidades egípcias Ísis e Osíris, a deusa grega Hécate, antigos textos gnósticos, hiperbóreos gregos, rei Herodes, o antigo testamento, o novo testamento, à Zarathrusta de Nietzsche, astrologia, ao artista Giacometti e à formação alquímica do ouro, para citar apenas alguns.
A premissa central do livro, diz Shamdasani, é que Jung havia se tornado desiludido com o recionalismo científico, que chamava de Zeitgeist, o espírito da época, e que durante o curso de muitos encontros com sua própria alma e outras figuras internas de sua psique, ele passa a conhecer e a apreciar “sua infinita profundeza”, um campo que traz à tona coincidências, sincronicidade e metáforas mitológicas através dos sonhos.
Uma excelente leitura, sem sombra de dúvidas, e uma nova pista no grande mistério de ser humano.
Carl Gustav Jung, tem em sonhos e visôes que fornecem material para o trabalho de toda uma vida. Dir-se-ia que se ele não houvesse se empenhado na integração de todo aquele material que jorrou qual lava derretida, teria fatalmente sucumbido a uma psicose.
Mas algo nele o impelia a ir adiante na compreensão de tudo o que se originava naturalmente de seu inconsciente.
Em suas palavras, "Os anos durante os quais me detive nessas imagens interiores constituíram a época mais importante da minha vida e neles todas as coisas essenciais se decidiram. (...)
Toda a minha atividade ulterior consistiu em elaborar o que jorrava do inconsciente naqueles anos (...)".Foi durante essa fase de confronto com o inconsciente que ele desenvolveu o que chamou de "imaginação ativa", um método de interação com o inconsciente onde este se investe espontaneamente de várias personificações (pessoas conhecidas e desconhecidas, animais, plantas, lugares, acontecimentos, etc.).
Na imaginação ativa interagimos ativamente com elas, isto é, discordando, quando for o caso, opinando, questionando e até tomando providências com relação ao que é tratado, isso tudo pela imaginação.
Ela difere da fantasia passiva porque nesta não atuamos no quadro mental, de forma a participarmos do drama vivenciado, mas apenas nos contentamos em assistir o desenrolar do roteiro desconhecido. Pela imaginação ativa existe não só a possibilidade de compreensão do inconsciente, mas também de interação com este, de forma que o transformamos e somos transformados no processo. Um personagem pode nos fazer entender falando explicitamente do motivo de, por exemplo, estarmos com insônia. Esse enfoque trata a psique como uma realidade em si, de forma tão literal interiormente, quanto uma maçã nos é real exteriormente, ao contrário de Freud que insistia em substituir uma determinada imagem por outra de cunho sexual. "Livro Vermelho": anos de "imaginação ativa" de Carl Gustav Jung, na tentativa heroica de explorar cada canto de sua própria mente.