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quarta-feira, 23 de agosto de 2023

Letters of Anton Chekhov to his family and friends

Ele era Médico e escritor, mas um grande escritor.
A FUNÇÃO DO ESCRITOR
Que o mundo «está infestado com a escória do género humano» é perfeitamente verdade. A natureza humana é imperfeita. Mas pensar que a tarefa da literatura seja a de separar o trigo do joio é rejeitar a própria literatura. A literatura artística é assim chamada porque descreve a vida como realmente é. O seu objectivo é a verdade 
 incondicional e honestamente. O escritor não é um confeiteiro, um negociante de cosméticos, alguém que entretém; é um homem constrangido pela realização do seu dever e pela sua consciência. Para um químico, nada na terra é puro. Um escritor tem de ser tão objectivo como um químico.
Parece-me que o escritor não devia tentar resolver questões como a da existência de Deus, do pessimismo, etc. A sua função é a de descrever aqueles que falam, ou pensam, acerca de Deus e do pessimismo, como e em que circunstâncias. O artista não devia ser juiz das suas personagens e das suas conversas, mas apenas um observador imparcial.
Têm razão em exigir que um artista deva ter uma atitude inteligente em relação ao seu trabalho, mas confundem duas coisas: resolver um problema e enunciar correctamente um problema. Para o artista, só a segunda é obrigatória.
Acusam-me de ser objectivo, chamando-lhe indiferença em relação ao bem e ao mal, falta de ideias e de ideais, etc. Querem que, ao descrever ladrões de cavalos, diga: «Roubar cavalos é mau». Mas isso é sabido há séculos, sem que eu tenha de o dizer. Deixem que um júri os julgue; a minha tarefa é simplesmente mostrar que género de pessoas são. Escrevo: estão a lidar com ladrões de cavalos e, assim, deixem-me dizer-lhes que não são mendigos, mas sim gente bem alimentada que segue um culto especial e que roubar cavalos não é um simples roubo, mas uma paixão. Claro que seria agradável combinar arte com sermões, mas, quanto a mim, é impossível por questões técnicas. Para descrever ladrões de cavalos em setecentas linhas, tenho de falar, pensar e sentir à maneira deles. De outro modo, a história não será tão compacta como os contos devem ser. Quando escrevo, conto inteiramente com o leitor para que acrescente à história os elementos subjectivos que lhe faltam.”Anton Tchekhov (29 de Janeiro de 1860 — 15 de Julho de 1904), médico, dramaturgo e escritor russo, em “Letters of Anton Chekhov to his family and friends”.