Há um prazer imenso em ser visto. A relação entre o prazer de ver ser visto.. exibicionismo e o sistema de reconhecimento amoroso narcisismo.. não é direta e natural.
Há várias formas de amar e ser amado, assim como há inúmeras maneiras de fazer o olhar entrar em uma relação erótica, desde o pornográfico ao tudo mostrar, do recato à ocultação calculada do olhar. Assim é a vida.
O que liga os dois, acontece no sujeito toda vez que ele assume uma imagem. Muito se critica as redes sociais e outros recursos da nova vida digital, por serem venenosos para nosso exibicionismo pulsional, estimulando a velocidade e a urgência de nossa reposição narcísica.
De fato, eles permitem que segmentemos nossas experiências selecionando "ângulos" muito específicos pelos quais queremos ser reconhecidos. Passamos a dominar a arte de recortar e recompor novos selfies e novas versões de nós mesmos, cada vez mais apurados por padrões de montagem e cosmetologia imaginária, em competição voraz por curtidas.
Mas como isso acontece✍️
A relação entre o prazer de ver e ser visto (exibicionismo) e o sistema de reconhecimento amoroso (narcisismo) não é direta e natural.
É por isso que o narcisismo é um sistema necessariamente instável, pois ele precisa de constantes reposicionamentos que jamais vão, de fato, responder à pergunta do narcisista, uma vez que esta pergunta está alienada ao desejo do Outro (alienado quer dizer aqui desconhecido, expulso para o exterior e estranhado).
O exibicionismo e a economia amorosa...
Não apenas uma diferença entre narcisismo e exibicionismo, que nos equalize e permita comparações, mas uma diferença que faça realmente diferença. Uma diferença diferente.
Podemos agora distinguir o exibicionismo e voyerismo (prazer do ver-e-ser-visto) deste sistema de quatro termos (eu, minha imagem, o Outro e a imagem que eu "acho" que produzo para este Outro), que regula nossa economia amorosa.
Observando mais de perto o mito grego compilado por Ovídio, vemos que Narciso está atraído por sua imagem, mas que, ao mesmo tempo, ele não reconhece sua imagem como sua. Mais ou menos como o bebê que "descobre" sua própria mão e fixando-se a ela como um objeto fascinante, porque é próprio e outro.
Portanto, o problema não é que Narciso está apaixonado por si e isolado um espaço individualista. Mas que ele precisa desesperadamente de outros para receber e confirmar sua própria imagem atraente de fascinação. O enigma representado por sua própria imagem é fascinante, porque o sujeito investiga e descobre as condições pelas quais ele um dia foi amado ou os traços pelos quais poderá voltará a ser amado.Não devemos confundir o exibicionismo (produção de prazer) com o narcisismo, essa equação que usamos para nos colocar diante dos outros e assim ganhar reconhecimento de acordo com o nosso desejo, o desejo do outro e as ideias que pré-determinam nosso laço social. Mas, além disso e da coerção e restrição impostas, há uma terceira alternativa: se fazer ver -assim como entre amar e ser amado existe o se fazer amar. Se apresentar como "olhável" ou "visível" é parte decisiva do narcisismo-social do sujeito e virou o mais corrente e digitalmente exponencial.
Disso deriva um terceiro tipo de sintoma: o histrionismo, patologia social antigamente conhecida como excentricidade, quando a insatisfação em ser reconhecido apenas como mais um leva a uma sensação de inexistência.
No histrionismo, convivem uma espécie de denúncia contra a soberania do olhar do Outro e um apelo pelo reconhecimento do sujeito, mais como diferença do que como parte ou identidade. Nessa condição, olhar e ser olhado (que faz parte do processo que vai da sedução ao encontro sexual) substitui o encontro sexual com outra pessoa, que passa a ser secundário ou acessório.
É algo da ordem do "em vez de" e não "parte do caminho para".
Freud observou que todas as práticas de natureza perversa -seja pela substituição dos fins, pela modificação dos meios ou pela qualidade seja pela quantidade- compõe a vida sexual de qualquer um, ainda que sob a forma de fantasias.Ocorre que no exibicionismo assim como no seu par diagnóstico inverso e complementar, o voyeurismo- a tendência a olhar, geralmente invadindo o espaço íntimo do outro, torna-se um fim em si mesmo.Em 1886, o psiquiatra alemão Richard Von Kraft- Ebbing incluiu o relato de 13 casos clínicos de exibicionismo em seu "Psichopatia Sexualis". São histórias tristes como a de um oficial do exército que só conseguia obter satisfação sexual ao exibir seu pênis ereto em andanças pelo parque central da cidade; do professor que acordava de seus transes com as calças arriadas, e o policial ao seu lado; ou do assistente de barbeiro que passa a vida indo e voltando da prisão por expor seus órgãos genitais a crianças e adultos.
Este por fim declarou: "Entendo meu crime, mas é como uma doença. Quando se apossa de mim, não posso impedir tais atos. Às vezes, por bastante tempo fico livre destas inclinações. Mas elas sempre voltam.Estamos povoados de imagens, cada vez mais férteis e interessantes, mas diante de quantas delas estamos em posição de dizer: "eu sou isso".
Na maior parte do tempo, estamos deslizando de uma imagem para outra ou nos esforçando para manipular a imagem que os outros fazem de nós, justamente para escapar deste terrível "você é isso".
Preferimos, ao contrário, a efemeridade do "estou, neste momento, sendo isso", mas quero garantir para mim mesmo e para os que me cercam que amanhã, ou digamos, daqui a duas horas, posso ser outra coisa. Basta mudar meu perfil.
O direito a transformar minha imagem, ou seja, o direito a criar novas identificações, torna-se um direito extremamente perigoso quando distribuído farta e amplamente.Perigoso, porque existe uma segunda maneira de ligar exibicionismo e narcisismo. Uma maneira que não exclui a identificação, mas que é uma identificação imposta pelo super-eu.
Ou seja, a liberdade de nos transformarmos e a efemeridade da experiência de ser-sendo passa rapidamente à coerção.E aqui entendemos porque as gramáticas de reconhecimento tendem a uma espécie de auto- exaustão, como o falecido Orkhut e o atual Facebook. A obrigação de ser outro cansa. O livro de Ovídio que traz o mito de Narciso chamava-se justamente Transformações (Metamorfose).
Quando todo mundo precisa ser novo e os outros são reconhecidos fazendo exatamente a mesma coisa que você para serem reconhecidos, inicia- se uma corrida pela quantidade que em algum momento exigirá uma mudança de qualidade.
Depois de injetar 20 litros de silicone ou de tatuar 90% de seu corpo, podemos ser assediados pelo cansaço e pelo desejo de encontrar uma nova diferença.
Há várias formas de amar e ser amado, assim como há inúmeras maneiras de fazer o olhar entrar em uma relação erótica, desde o pornográfico ao tudo mostrar, do recato à ocultação calculada do olhar. Assim é a vida.
O que liga os dois, acontece no sujeito toda vez que ele assume uma imagem. Muito se critica as redes sociais e outros recursos da nova vida digital, por serem venenosos para nosso exibicionismo pulsional, estimulando a velocidade e a urgência de nossa reposição narcísica.
De fato, eles permitem que segmentemos nossas experiências selecionando "ângulos" muito específicos pelos quais queremos ser reconhecidos. Passamos a dominar a arte de recortar e recompor novos selfies e novas versões de nós mesmos, cada vez mais apurados por padrões de montagem e cosmetologia imaginária, em competição voraz por curtidas.
Mas como isso acontece✍️
A relação entre o prazer de ver e ser visto (exibicionismo) e o sistema de reconhecimento amoroso (narcisismo) não é direta e natural.
É por isso que o narcisismo é um sistema necessariamente instável, pois ele precisa de constantes reposicionamentos que jamais vão, de fato, responder à pergunta do narcisista, uma vez que esta pergunta está alienada ao desejo do Outro (alienado quer dizer aqui desconhecido, expulso para o exterior e estranhado).
O exibicionismo e a economia amorosa...
Não apenas uma diferença entre narcisismo e exibicionismo, que nos equalize e permita comparações, mas uma diferença que faça realmente diferença. Uma diferença diferente.
Podemos agora distinguir o exibicionismo e voyerismo (prazer do ver-e-ser-visto) deste sistema de quatro termos (eu, minha imagem, o Outro e a imagem que eu "acho" que produzo para este Outro), que regula nossa economia amorosa.
Observando mais de perto o mito grego compilado por Ovídio, vemos que Narciso está atraído por sua imagem, mas que, ao mesmo tempo, ele não reconhece sua imagem como sua. Mais ou menos como o bebê que "descobre" sua própria mão e fixando-se a ela como um objeto fascinante, porque é próprio e outro.
Portanto, o problema não é que Narciso está apaixonado por si e isolado um espaço individualista. Mas que ele precisa desesperadamente de outros para receber e confirmar sua própria imagem atraente de fascinação. O enigma representado por sua própria imagem é fascinante, porque o sujeito investiga e descobre as condições pelas quais ele um dia foi amado ou os traços pelos quais poderá voltará a ser amado.Não devemos confundir o exibicionismo (produção de prazer) com o narcisismo, essa equação que usamos para nos colocar diante dos outros e assim ganhar reconhecimento de acordo com o nosso desejo, o desejo do outro e as ideias que pré-determinam nosso laço social. Mas, além disso e da coerção e restrição impostas, há uma terceira alternativa: se fazer ver -assim como entre amar e ser amado existe o se fazer amar. Se apresentar como "olhável" ou "visível" é parte decisiva do narcisismo-social do sujeito e virou o mais corrente e digitalmente exponencial.
Disso deriva um terceiro tipo de sintoma: o histrionismo, patologia social antigamente conhecida como excentricidade, quando a insatisfação em ser reconhecido apenas como mais um leva a uma sensação de inexistência.
No histrionismo, convivem uma espécie de denúncia contra a soberania do olhar do Outro e um apelo pelo reconhecimento do sujeito, mais como diferença do que como parte ou identidade. Nessa condição, olhar e ser olhado (que faz parte do processo que vai da sedução ao encontro sexual) substitui o encontro sexual com outra pessoa, que passa a ser secundário ou acessório.
É algo da ordem do "em vez de" e não "parte do caminho para".
Freud observou que todas as práticas de natureza perversa -seja pela substituição dos fins, pela modificação dos meios ou pela qualidade seja pela quantidade- compõe a vida sexual de qualquer um, ainda que sob a forma de fantasias.Ocorre que no exibicionismo assim como no seu par diagnóstico inverso e complementar, o voyeurismo- a tendência a olhar, geralmente invadindo o espaço íntimo do outro, torna-se um fim em si mesmo.Em 1886, o psiquiatra alemão Richard Von Kraft- Ebbing incluiu o relato de 13 casos clínicos de exibicionismo em seu "Psichopatia Sexualis". São histórias tristes como a de um oficial do exército que só conseguia obter satisfação sexual ao exibir seu pênis ereto em andanças pelo parque central da cidade; do professor que acordava de seus transes com as calças arriadas, e o policial ao seu lado; ou do assistente de barbeiro que passa a vida indo e voltando da prisão por expor seus órgãos genitais a crianças e adultos.
Este por fim declarou: "Entendo meu crime, mas é como uma doença. Quando se apossa de mim, não posso impedir tais atos. Às vezes, por bastante tempo fico livre destas inclinações. Mas elas sempre voltam.Estamos povoados de imagens, cada vez mais férteis e interessantes, mas diante de quantas delas estamos em posição de dizer: "eu sou isso".
Na maior parte do tempo, estamos deslizando de uma imagem para outra ou nos esforçando para manipular a imagem que os outros fazem de nós, justamente para escapar deste terrível "você é isso".
Preferimos, ao contrário, a efemeridade do "estou, neste momento, sendo isso", mas quero garantir para mim mesmo e para os que me cercam que amanhã, ou digamos, daqui a duas horas, posso ser outra coisa. Basta mudar meu perfil.
O direito a transformar minha imagem, ou seja, o direito a criar novas identificações, torna-se um direito extremamente perigoso quando distribuído farta e amplamente.Perigoso, porque existe uma segunda maneira de ligar exibicionismo e narcisismo. Uma maneira que não exclui a identificação, mas que é uma identificação imposta pelo super-eu.
Ou seja, a liberdade de nos transformarmos e a efemeridade da experiência de ser-sendo passa rapidamente à coerção.E aqui entendemos porque as gramáticas de reconhecimento tendem a uma espécie de auto- exaustão, como o falecido Orkhut e o atual Facebook. A obrigação de ser outro cansa. O livro de Ovídio que traz o mito de Narciso chamava-se justamente Transformações (Metamorfose).
Quando todo mundo precisa ser novo e os outros são reconhecidos fazendo exatamente a mesma coisa que você para serem reconhecidos, inicia- se uma corrida pela quantidade que em algum momento exigirá uma mudança de qualidade.
Depois de injetar 20 litros de silicone ou de tatuar 90% de seu corpo, podemos ser assediados pelo cansaço e pelo desejo de encontrar uma nova diferença.
O primeiro sinal de que isso está acontecendo é o cansaço do exibicionismo.
Então...diga...
Então...diga...